Lucas Mendes
Em 1975, surgiu a oportunidade de trabalhar na Rede Globo, a convite do jornalista José Itamar de Freitas, na época editor-chefe do Fantástico. Lucas conta que, antes de começar, foi encaminhado para fazer um treinamento no Rio de Janeiro com a fonoaudióloga Glorinha Beuttenmüller, para melhorar sua voz. “Eles me botaram no Hotel Everest, fiquei lá uma semana em um esforço inútil da dona Glorinha, porque a minha voz de mineiro é para dentro mesmo, é uma voz muito ruim para rádio e televisão. Se fosse nos Estados Unidos ou na Inglaterra, eu jamais faria rádio ou televisão com esta voz”.
Lucas Mendes teve o privilégio de iniciar sua carreira como jornalista sem a pressão da censura, que começou a apertar no Brasil logo que ele foi para os Estados Unidos. Naquela época, não existiam videoteipe nem satélite. “Mandava a fita de avião, raramente dava para entrar no Jornal Nacional, só quando tinha um acontecimento maior”, conta. Durante sua carreira no escritório da Globo em Nova York, cobriu eventos memoráveis com matérias para o Jornal Nacional, Jornal da Globo, Fantástico e Globo Repórter, como a entrevista exclusiva com Robert Gallo, um dos cientistas que identificou o vírus da AIDS, a Guerra das Malvinas, o caso Watergate e a renúncia de Richard Nixon e as posses dos presidentes americanos Jimmy Carter (1977) e Ronald Reagan (1981). A cobertura da posse de Carter, que mobilizou dezenas de profissionais, muitos vindos do Brasil, foi a primeira cobertura de vulto, produzida pelo jornalismo da Globo, da qual o jornalista participou.
Em outubro de 1978, mais de 900 fiéis de uma seita comandada pelo pastor Jim Jones se suicidaram em Jonestown, na Guiana. Lucas Mendes foi enviado para a região com toda a estrutura para produzir a cobertura da notícia, mas teve que enfrentar uma censura por parte dos americanos que não queriam a imprensa estrangeira lá. “Era uma matéria para o Fantástico. Tínhamos o avião, o piloto, tínhamos tudo, e não nos deixaram descer em Jonestown. Não fizemos imagem do local.” A cobertura de fatos marcantes dos anos 1980, como o assassinato de John Lennon (1980), o caso Irã-Contras (1986) e a explosão do ônibus espacial Challenger (1986) trariam ainda mais experiência à carreira de repórter de Lucas Mendes. A prática o levou a definir uma reportagem para TV como uma história contada em 90 segundos e que tem na imagem seu ingrediente principal. “A minha ideia da matéria era o seguinte: não entrar em conflito com a imagem. As imagens na televisão são, quase sempre, mais importantes que o texto. Quando elas contam, você não interfere, você não atrapalha”.
Entrevistas com personalidades-chave também marcaram sua carreira. Em seu currículo, estão conversas com o cineasta Woody Allen, o pugilista Muhammad Ali e o líder palestino Yasser Arafat. Esta última foi uma aventura marcante. Através de um contato intermediado por um pastor do estado americano de Delaware, Lucas Mendes foi à Palestina em 1979 entrevistar Arafat. A longa espera até conseguir encontrar o entrevistado o marcou: “A sensação de ficar três semanas naquele lugar… Naquela época era uma barra pesada – tiro a noite inteira, morteiro, Israel passava com os aviões fazendo rasantes, mesmo durante o dia, rompia a barreira do som, fazia uma explosão terrível em cima da cidade”.
Lucas Mendes trabalhou no escritório da Globo em Nova York de 1975 a 1990. Em seguida, foi trabalhar na TV Record, até o escritório da emissora em Nova York ser fechado em 1992. Passou nove meses sem emprego fixo. Em 1993 veio o convite do GNT, que daria origem a um dos programas mais bem-sucedidos da TV a cabo brasileira, o Manhattan Connection.
O GNT queria produzir um programa de reportagens internacionais, mas tinha uma verba pequena para o projeto. Lucas Mendes sugeriu um formato de estúdio. A ideia da “Conexão” surgiu de um projeto antigo que ele tinha com Paulo Francis para um programa de rádio, que acabou não dando certo. Com a concretização do Manhattan, os dois amigos consolidaram profissionalmente uma parceria que começou ainda na década de 1970. Foi por intermédio de Lucas que Francis entrou para a Globo.
O Manhattan Connection estreou em março de 1993. O programa é um painel semanal que discute fatos políticos, econômicos e culturais com um tempero de polêmica. Lucas Mendes é o mediador que rege e equilibra os comentários dos outros participantes. Nas palavras de Lucas, o segredo do programa é reunir “pessoas com personalidade forte, controvertidas, ideias próprias”. A primeira formação da mesa tinha, além de Lucas, Nelson Motta, Caio Blinder e Paulo Francis, que marcou o Manhattan com seus comentários ácidos, controversos e imprevisíveis. Depois de sua morte, em 1997, sua cadeira foi ocupada por personalidades que pudessem desempenhar um papel similar ao de Francis. Arnaldo Jabor cumpriu a tarefa durante seis anos. Hoje, o papel de principal polemista da Conexão está com Diogo Mainardi, que compõe a mesa com Lucas Mendes, Caio Blinder, Ricardo Amorim e Pedro Andrade. Já passaram também pela bancada do Manhattan Connection o antropólogo Roberto da Matta, o teatrólogo Gerald Thomas e a jornalista Lúcia Guimarães. Depois de ficar no GNT durante 17 anos, o Manhattan Connection mudou de casa. Agora é transmitido pelo canal de notícias GloboNews.